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quarta-feira, 15 de agosto de 2012

"SEr PoeTa é TambÉm SeR ParVo"

Hoje ouvi uma insinuação espectacular sobre ser lírico. “ - Ser poeta é também ser parvo.”Confesso que aceitei esta decifração cultural e artística com algum desportivismo e regozijo. Concordo em absoluto com tal afirmação.
A parvalhice e a parvalheira de uma atitude parva são “poetar” a poesia com rimas sem ritmo e por quadras sem métrica. Um soneto para a Diva da nossa poesia – Florbela Espanca – era a mesma coisa que “… com o luar matar a sede ao gado / dar às pombas o sol num grão de milho…” Rústica. Para o patrono da nossa poesia Luís Vaz de Camões era como uma palestra “… que para respirar lhe falte o vento / e para tudo, enfim, lhe falte o mundo! Ditosa Ave. E para o imenso Fernando Pessoa, nas figuras a que deu vida (Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos) “O poeta é um fingidor. / Finge tão completamente / que chega a fingir que é dor / a dor que deveras sente.” Autopsicografia.
Desde os meus dezassete anos que sou parvo. Desde que nasci que vivo com esse cunho. Eu mereço isso. O amigo que me mimoseou com esse rótulo sabia o que queria dizer. Confesso que estava certo e está certo. Não me espantou tal açoite verbal, por ser genuíno e autêntico. Agora espanta-me a tourada de um estouvado “estraga albardas” que nos rimou com uma metrificação de cornos de índole imaterial. Enorme “poeta” este! O mesmo que dizer: - … que grande parvo, adulterado me “saiu”! (diga-se).
Vivo numa terra dado ao tosco. Que culturalmente é uma nulidade. Só existe a arte de manusear o garfo e faca de volta da célebre chicha de cabra. A, confrade chanfana. Mata-se tudo que seja “poetar”. Não há uma viva alma que possa dar azo ao seu imaginário artístico. Desde o desporto, passando pelo cantar, escrevinhar, declamar, representar… e todas as outras formas de expressão da parvalhice. A “parvalheira” é essa.  
Mas, ser parvo é comigo. Com Linhares, Neves e uns poucos parvalhões. Aqueles que promovem o seu aríete científico. Divagar não paga imposto. “Poetar” não usa impostos, porque sim ou porque não. Querelar com a alma não paga emolumentos. Vivo nesta bodega, sem me escutar e tão pouco ouvir os outros parvos como eu. Não temos umas cadeiras e mesa sequer, debaixo de uma barraca, em que possamos aparvalhar as nossas idiotas, idiotices com idiotismo. É triste ser parvo nesta terra. Temos um enorme edifício cor de laranja que sobeja a um azedo bafiento que nos lembra o facho de um regime que ostenta o betão como centro cultural de animais menores. Desde aranhas a ratos passando por morcegos e pombas, etc. … Estar “cinzento-claro” nestas obras de entretenimento fechadas aos seus é comunicar uma “merda”. É como quem deseja sorte aos estreantes em palco e estes não saberem o seu papel...
Um parvo como eu desfruta: - de jardins reclusos… de casas de banho públicas cerradas. De piscinas secas e enxutas (fixe… está-se bem). De calvícies lavradas nos pináculos de uma cordilheira. De pavilhões desportivos ataviados de pó. De cabrinhas bombeiro… de praias fluviais sem rio nem areais (são tão lindinhas e bonitinhas no papel). De um Campo de Golfe que não possui espaço para os 18 buracos no terreno. De uma ribeira emparedada para os gambozinos escalarem… Em suma, desfruto de uma panóplia de parvoíces, que me aparvalham o eu ser parvo.      
Gostava de partilhar muitas das minhas parvoíces. Mas lorpa não “sou” de todo. Ser parvo já me custa, baba e ranho, nesta terra dado ao tosco. Prefiro ouvir um bom amigo dizer que sou parvo… que continuar a ser parvo. Só me engana quem eu quero e deixo, ou quem puxa do seu engenho e arte para se dar ao parvo. Quando se junta muita parvoíce junta, tenho dificuldade de fazer prevalecer a minha auréola de ser apatetado.  
Temo que o tempo não me permita ser imbecil por muito tempo para ver o que pretendia … Mas enquanto por cá, vou-me divertindo com a minha paspalhice.
A patranha da argola ainda vai fazer furor nas próximas escolhas. Ainda existem muitas valetas a precisar de consistência para “entubar” a água na esperança de dar água às fragas, no singular. (A Fraga). Em metáfora a abundância do precioso líquido transborda…
Gostava de assistir a um recital de parvos aonde a parvoíce fosse bem tratada. Que uma dor valesse por um cento. Que para grandes males se aplicassem grandes remédios. Que se empregassem as mezinhas individuais em prol da comunidade em geral. Aonde uma fornalha de bons idiotas fizessem o ecumenismo pratico para dar a extrema-unção a esta “mancha” que desponta de um falso, parvo.
Amigo, adorei essa do “parvo”. A minha estima saiu redobrada. Grato.
ALBERTO DE CANAVEZES