UMA POÇÃO DE HUMANIDADE.
Trecho 3 / Março,
20 de 2020.
O Instagram, Facebook,
Twitter, WhatsApp…. fazem o longe ser perto e o perto já ali. E assim vamos
abraçando a saudade por um olhar de ver. E vamos passando o tempo.
A época que vivemos hoje
faz-nos ser mais meditabundos e capacitar que andamos arredados das verdadeiras
causas familiares e comunitárias. Sofremos nós os humanos… mas a natureza
aproveita para se regenerar… E neste interlúdio, as memórias assolam-nos.
Em 1973 havia um folhetim
radiofónico “Simplesmente Maria” que parava a povoação de Sabouga pela hora do
almoço. O rádio do Ti Ferreira era sintonizado na Quintã. E abrangia a povoação
quase toda. O enredo era a sobremesa social de uma comunidade recolectora. Alberto um galã citadino e Maria a provinciana
que procurava um novo estatuto… foi um arco-íris no enlevo romântico que
caracterizava a paisagem humana e natural da aldeia. O tempo que durava a
audição os “ais” e o “ui” das mazelas de cada um, era substituído pelo balar
das ovelhas e berregar das cabras tendo como compasso mais melódico o chilrear
dos passarinhos. A minha Tia São era uma
fã da Maria que a família do Alberto para ela não passava de uns “grandes cabrões
…”. Pelas súplicas dela, “todos os coriscos” que os pudessem “abrasar” eram
poucos. Fascinava-me a conjugação de enredos que estendido numa paveia de fetos,
debaixo de uma latada de uvas morangueiras – que aroma - deleitava-me atónito. O
pátio da minha Tia São era o ponto de encontro da malta que vinha passar
ferias. O mês de agosto polvilhava de irreverência toda a comunidade. Os
namoricos aconteciam. As arvores de fruto eram abalroadas. Os capoeiros de
quando em vez perdiam o seu líder ou a galinha mais poedeira. Que em surdina ouvíamos
relatos das ocorrências culpando a raposa, javalis e “outras aves raras”.
Na eira do povo dançávamos ao
som da grafonola do meu Pai e a folia sobrevinha de uma maneira tão inocente
que o pecado maior nascia por não haver luzência artificial. Estar e ser desalumiado,
sobrepunha-se. Quando o sol se punha e a
lua aparecia, o candeeiro a petróleo ou o gasómetro, significavam luz e passos
mais alinhados.
Os rebanhos de cabras e
ovelhas eram inúmeros. Eram dezenas e dezenas de cabeças de gado. Preenchiam todas
as ruas numa algazarra que faziam de todos nós – urbanos imberbes – pastores marionetes.
Quem nos manipulava – os anciãos - fazia-o com tanta maestria que parecíamos
profissionais da coisa. Cada um com um
cajado e o seu farnel numa cesta íamos até à Serra do Bidoeiro, deslumbrar o
panorama e descobrir as suas belezas e história.
… … …
E a história de hoje é uma novidade…,
mas a memória que ela transporta e que nos trouxe até aqui, obriga-nos a
atravessar um caminho de ferro que nem sempre nos deixa parar em todos os seus apeadeiros.
Mas mesmo assim existe a necessidade de lembrar uma placa que é comum a todos, que
nos informa: - “Para. Escuta e Olha”.
… … …
(a "coisa" vai
seguir).