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segunda-feira, 23 de março de 2020


UMA POÇÃO DE HUMANIDADE.

Trecho 5 / Março, 24 de 2020

Existem sempre umas páginas na nossa vida que se viram e nos deixam um vazio. Não que nelas não tenhamos vivido algo intenso, mas porque sentimos a necessidade que elas nos entreguem a um escudete. De nos olharmos. De nos harmonizarmos.
Ao longo da minha vida idealizei sonhos. Vivi as suas realidades, também. E habitei as duas vertentes das causas que definem o adequado e o inadequado. Obviamente que sim. Apliquei o que de melhor de mim personifica o oitenta e o oito mil nos campos das interpretações. Não me quedo em lado nenhum em que esse terreno nada me enuncie. Não sei fingir. Sou incapaz de pensar uma coisa e dizer outra. E, no entanto, existe sempre quem saiba mais de mim, que eu próprio.  
( Vitimização!?   Mitigação!? - Escolham. Das duas hipóteses, eu escolho outra... )     
Não tenho amigos, amigos de grandes folias e motejos. Possuo no meu portefólio social, pessoas que se relacionam comigo. E dessas existem quem me passe cartuxo, quando as minhas convicções lhes dão proveito. E varia conforme a cadência dos acontecimentos e interesses. O que para mim não me desvirtua, tão pouco me entusiasma. Como sempre digo: - eu em mim!
Nestes últimos tempos por motivos de debilidade – a C6 – tenho-me retido em casa. A dormência e falta de sensibilidade são uma sina muito pesada para quem sempre teve da sua profissão uma noção de uma actividade social. Ser carteiro, preenche-me a alma e faz de mim um homem muito bem resolvido profissionalmente. A vontade pede-me para estar no activo neste momento tão difícil para todos nós, mas o corpo estadeia inumeráveis reticências. Penitencio-me austeramente por isso. Embora apeado do verdadeiro cenário da guerra, porque estou por casa, tenho vivido esta tormenta com olheiras.
Sinto-me enjaulado pela enfermidade e prisioneiro do pouco truísta “COVID 19”. Sinto que os meus canários - mesmo na gaiola - são mais livres que eu. Desconfio que o Elvis e a Panchita não desconfiam porque estou por casa. Ambos latem. O Elvis um lavrador. A Panchita uma rafeira. Na hora da refeição – cinco e trinta – julgo ouvir o ZÉ Cabra nele e a Maria Leal, nela. Fico dissonante, integralmente consumpto. Limpo o cárcere de cada um, deixando-os azeitadinhos. Creiam, que faço tudo, para os perros não se aperceberem das causas que me parqueiam em casa. A coluna … e são colunas que os separam… os animais sabem que eu sou um bom progenitor. Já conhecem os meus cinco filhos. Não os quero a seguir a minha fertilidade, pois eu já sou um teso do caraças e mais bocas cá em casa era um grande rombo.  Ele e ela, ambos - são virgens. Pavoneiam-se. Ela deve-lhe dizer, “tenho-a aqui, mas toma lá só um cheirinho” … e ele, “o que tu queres, dá-te uma mijinha” ….  
Não sei se os deixe fornicar. Admito que ultimamente tenho pensado muito nisso. Pois sempre ouvi dizer que “até os bichinhos gostam”.  E isso é um quiproquó que no futuro me pode trazer alguns dissabores. Não vá um gaijo saber para onde vai e aonde pode ficar apeado …. Entrementes há uma Sede em Roma que perdoa quem cometeu pecados e morre hodiernamente hediondamente. Actualmente é sempre uma recomendação que nos tranquiliza. Existem decretos que são feitos para uma coisa, mas abrangem outras agendas em tempos de guerra e solidão…. suportam de bula e gula. Espero que por eu me deleitar imenso com aquilo que julgo que eles gostassem, não seja penalizado por não proporcionar essa conexão aos dois. Hoje como estamos de quarentena e somos quatro cá em casa sem trabalhar, temos outras preocupações. O dinheiro é pouco para nós e eles também comem. Nós não temos o ouro e usufruirmos de ostentação de riqueza como alguns que andam sempre de mão estendida. Não sou masoquista, mas sou obrigado a reconhecer que de vez enquanto também contribuo para esse peditório. É intrigante saber para que serve isso agora.
… … …  
É um dilema impetuoso não seguir a tentação de sair de casa e ir abastecer os carros da família a umas bombas de gasolina. Agora que a economia parou e as rodovias ficaram desertas as bombas sofrem de uma guerra sem quartel. Milhões de popós pararam e por incrível que pareça engodam-nos com preços cada vez mais pequenininhos. Só pode ser gozo! 

(a "coisa" vai seguir).